Sunday, May 15, 2011

Ambiente e Responsabilidade

A responsabilidade civil da Administração Pública, no que toca ao ambiente, está dividida em duas partes na sistemática da Constituição da República Portuguesa: a responsabilidade subjectiva, enquanto responsabilidade perante o direito fundamental ao ambiente dos particulares, e responsabilidade objectiva no que concerne à tarefa estadual de defesa dos bens jurídicos ambientais. O tema da responsabilidade por danos ambientais está, assim, intimamente ligada ao Direito administrativo. A circunstância de o direito do ambiente se ter tornado uma “tarefa inevitável do Estado Moderno” (BREUER) fez com que a responsabilidade administrativa por danos ambientais se autonomizasse das restantes e que fosse ela própria especificada em três vectores:

a) Responsabilidade por actos de gestão pública

b) Responsabilidade por actos de gestão privada

c) Responsabilidade comum de actos de gestão pública ou privada sem que esteja em casa o actor popular

Para o Professor Vasco Pereira da Silva, a distinção entre os actos de gestão pública e actos de gestão privada é uma tarefa difícil, pois, esta traz uma dualidade de jurisdições no nosso sistema jurídico quando o ideal seria uma unificação das mesmas, já que a competência dos tribunais para apreciarem e decidirem os casos de responsabilidade civil por danos ambientais tanto pode recair sobre os tribunais comuns como sobre os tribunais administrativos. Esta dualidade de responsabilidade por actos de gestão pública ou privada é já resolvida pela Alemanha onde existe uma única legislação aplicável a qualquer dano ambiental e consequente responsabilidade civil independentemente de quem seja o responsável, bem como a existência de um único tribunal competente para resolver tais conflitos. Em Portugal o que se verifica é que, pelos danos causados no desempenho de actividades de gestão privada, a Administração responde segundo o Direito Civil perante tribunais judiciais; e pelos danos causados no desempenho de actividades de gestão pública, a administração responde segundo o Direito Administrativo perante os tribunais administrativos.

A passagem para uma administração prestadora e infra-estrutural trouxe a ideia de que as actividades técnicas da administração não se pautam apenas por critérios jurídicos mas sim também por critérios técnicos que não se reconduzem à ideia de gestão pública e que são dificilmente distinguíveis das actividades dos privados. Daí alguma doutrina afirmar, como já realçamos anteriormente, não fazer sentido esta destrinça entre actos de gestão pública e actos de gestão privada.

A Responsabilidade por actos de gestão pública

Não obstante esta ideia defendida, actualmente a actuação da administração e a sua responsabilidade por actos de gestão pública está consagrada na lei 67/2007, que foi alterada pela lei 31/2008, que revogou o decreto-lei 48051 de 21 de Novembro de 1963.

Este diploma consagra então duas modalidades de responsabilidade civil da administração:

1) Responsabilidade pelo facto ilícito

2) Responsabilidade pelo risco

O primeiro tipo de responsabilidade que se encontra no artigo 7º da lei anteriormente referida é um tipo de responsabilidade subjectiva baseada na culpa. Por facto ilícito entende-se os actos jurídicos, incluindo os actos administrativos que violem normas legais, as normas regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis. O segundo tipo de responsabilidade, que se encontra no artigo 11º do referido diploma, é do tipo objectiva, pois, prende-se com a actividade de certos serviços administrativos excepcionalmente perigosos como por exemplo as centrais de produção de energia.

A responsabilidade ambiental pode ser resolvida de duas maneiras: a reconstituição natural da situação anterior à lesão ou a indemnização por sucedâneo pecuniário quando a situação não for possível de restituir. Esta ideia resulta do artigo 48º da Lei de Bases do Ambiente que estabelece a obrigação do lesante “remover as causas da infracção e de repor a situação anterior à mesma ou equivalente” e “o pagamento de indemnização”. Esta disposição aplica-se, então, a todo o tipo de responsabilidade ambiental mesmo que seja administrativa.

A Responsabilidade por actos de gestão privada

A responsabilidade por actos de gestão privada encontra-se regulada nos artigos 483º e seguintes do Código Civil. Este regime aplica-se tanto às relações interprivadas como às relações em que a administração pública intervém em que não exerce os seus poderes de autoridade. Os pressupostos para que se verifique esta responsabilidade são: facto ilícito, culpa do agente, prejuízo, nexo de causalidade entre facto e prejuízo. Existe uma particularidade neste regime, constante no artigo 501º, que se aplica quando existe responsabilidade pelas autoridades públicas pelos actos dos seus órgãos ou funcionários em que a responsabilidade é solidária. Outra particularidade de regime encontra-se no artigo 509º no que diz respeito a danos causados por instalações de energia eléctrica ou de gás que pode configurar uma lesão ao ambiente. Na Lei de Bases do Ambiente, no artigo 41º, encontra-se também consagrada uma outra modalidade de responsabilidade objectiva da competência dos tribunais comuns que estatuí que “existe obrigação de indemnizar, independentemente de culpa, sempre que o agente tenha causado danos significativos no ambiente, em virtude de uma acção especialmente perigosa, muito embora com respeito do normativo aplicável”.

Uma das questões que se verifica neste tipo de responsabilidade prende-se com a necessidade de existir um seguro obrigatório para cobrir os problemas de responsabilidade civil objectiva relativamente a “actividades que envolvam alto grau de risco para o ambiente” que se encontra consagrado no artigo 43º da mesma Lei de Bases que introduz uma ideia de socialização do risco de determinadas actividades susceptíveis de lesar o ambiente. Esta disposição pretende enaltecer o princípio da prevenção da actividade ambiental de modo a criar condições que garantam a reconstituição natural da lesão bem como a eventual obrigação de indemnizar os lesados por parte de quem cometeu a lesão.

A Responsabilidade comum a actos de gestão pública e de gestão privada sempre que esteja em causa o actor popular

Por último, resta explicar em que consiste a responsabilidade comum a actos de gestão pública e de gestão privada sempre que esteja em causa o actor popular.

A Lei 83/95 consagrou o direito de participação procedimental e de acção popular que respeita o artigo 52º da Constituição da República Portuguesa. Com a revisão de 1989 a Constituição alargou o direito de acção popular para os direitos fundamentais ao afirmar que “é conferido a todos (…) o direito de promover a prevenção, a cessação ou a perseguição judicial das infracções contra a degradação do ambiente e da qualidade de vida” (vide o artigo 52º nº 3, na formulação da revisão constitucional de 1989. A própria Lei de Acção Popular consagra, no seu artigo 23º, a existência de responsabilidade civil objectiva, “sempre que de acções ou omissões do agente tenha resultado ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos”, o que nada acrescenta ao já exposto na Lei 67/2007. A Lei de Acção Popular é uma lei que confere, acima de tudo, legitimidade aos particulares para agirem contra eventuais lesões de direitos e interesses legalmente protegidos de todos os particulares.

Por isto, o Professor Vasco Pereira da Silva afirma que esta lei nada trouxe de novo ao regime de responsabilidade civil por actos de gestão privada ou pública e que, ainda por cima, o tornou ainda mais confuso e ineficaz.

Assim, explicado em traços gerais o regime da responsabilidade perante danos ao ambiente, verifica-se que este é algo confuso, que existe ainda um longo caminho a percorrer de modo a tornar a jurisdição dos tribunais mais clara. É neste sentido que o professor confessa que o direito administrativo tem um “trauma da sua infância difícil” e que se encontra também aqui neste regime. Ao estarem ao dispor do tribunais tantos diplomas como, a Constituição, a Lei da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado, o Código Civil e a Lei de Acção Popular, de modo a aferir da responsabilidade por danos ambientais, é de fácil percepção que os problemas jurisdicionais e de competência que daqui advêm só tornam o regime e o processo mais complexo.

Bibliografia:

- Vasco Pereira da Silva, “Verdes são também os direitos do Homem; Responsabilidade Administrativa em Matéria de Ambiente”, Principia, Cascais, 2000.

- Vasco Pereira da Silva, “Verde Cor de Direito; Lições de Direito do Ambiente, Almedina, 2001.


Frederico Filipe Mendes Barata

Turma 8

Nº 17789

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